A nova safra de diretores brasileiros surgida nos últimos anos tem buscado inovar através da linguagem e da técnica, e o público parece tomar gosto pelo cinema made in Brazil. Foi assim com “Cidade de Deus” (2002) de Fernando Meirelles, talvez o maior exemplo desse fenômeno. Esta linguagem e técnica comum nas produções americanas, agora utilizados para contar nossas histórias, arrancam do espectador frases ingênuas do tipo: “nem parece filme brasileiro!!” Se isso é bom ou ruim, não cabe a mim aqui julgar, mas se o público puder deixar o preconceito de lado com nosso cinema e prestigiar mais o produto nacional nem que seja por meio da linguagem empregada , já é válido.
“Dois Coelhos” (Brasil, 2012), do diretor estreante em longa-metragem Afonso Poyart é um filme de ação que chama atenção pelo visual colorido dos grafismos e cultura pop, efeitos especiais e a frenética edição combinados com a trilha sonora predominante do Radiohead na cadencia de um roteiro mirabolante que lembra, entre outros filmakers estrangeiros, o irreverente Tarantino. Há quem identifique influencias do diretor Zack Snyder (Sucker Punch – Mundo Surreal/2011) e Guy Ritchie (Snatch – Porcos e Diamantes/2000), aquele um tanto fantasioso e este com canos fumegantes a mais – não chega a ser o caso do nosso coelho. Bem, a comparação quase inevitável é uma questão de leitura, mas ao mesmo tempo pode sugerir que o produto nacional perde um pouco no quesito originalidade.
Influências à parte, todos estes elementos incrementam a narrativa em off sobre a trajetória de Edgar (Fernando Alves Pinto) um bon vivant viciado em sexo e vídeo-game que torna-se um anti-herói em crise existencial e busca redimir-se de suas desenfreadas (literalmente falando) trombadas pela vida. A misteriosa ligação entre a personagem Julia (Alessandra Negrini) e os demais vai se desenrolando ao sabor da narrativa não-linear – estratégia apropriada que consegue amarrar o espectador até o desfecho da trama justificando os fins e os meios pretendidos por Edgar. Por outro lado, ficam algumas lacunas no roteiro que, por exemplo, não deixa claro o papel de Sophia (Aldine Muller), a esposa do deputado corrupto.
Com tomadas sofisticadas de uma câmera por vezes nervosa, e uso frequente de slow motion, o filme segura o suspense e o jogo de gato e rato dos envolvidos na trama, alternadamente arrancando risos com os diálogos insólitos (tipicamente tarantinescos) somados ao linguajar entre bandidos e mocinhos com pitadas de filosofia. Aliás, aqui bandido e mocinho “é tudo farinha do mesmo saco”, pois as motivações de cada um não justificam um propósito nobre ou heróico. No contexto do filme ladrão que rouba ladrão não merece perdão.E a piada maior (e sem graça) é mostrar como ainda se mantém impune, atuante e bem articulada a corrupção que apodrece as diferentes esferas das instituições brasileiras.
Não se pode negar que “Dois Coelhos” tem um ótimo elenco (destaque para Caco Ciocler e Marat Descartes) e consegue conquistar o público mais jovem pelos seus méritos visuais. No mais é eficiente naquilo que proporciona: entretenimento e a compensação de podermos ver na tela um pouco do Brasil de hoje mesmo que através de uma concepção técnica bem acabada tipo exportação.
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