Não há como negar que Quentin Tarantino seja um dos diretores mais cultuados pela nova geração de cinéfilos. Seus trabalhos são sempre compensadores a quem busca não apenas por diversão e lazer no cinema, mas também para quem já é, digamos, um ‘iniciado’ e deseja novamente adentrar ao ‘mundo tarantiniano’ onde o evento mais improvável ou mais corriqueiro pode surgir de modo surpreendente na próxima cena.
Mike (Kurt Russel) é um dublê de antigos filmes dos anos 70 e nas horas vagas assume o papel de um maníaco sobre rodas nas estradas do Texas e do Tenessee. Suas vítimas são lindas - e tampouco ingênuas - garotas de cidadezinhas. Elas são escolhidas a dedo e perseguidas por ele em seu possante carro à prova de morte. O enredo pode parecer simples, mas Tarantino coloca como motor do filme sua fixação por temas que mostram a equação entre violência e vingança em suas diferentes formas, aqui no caso um carro utilizado como arma mortal. Não poderia faltar a ambientação, a música e o visual que remete aos anos 70 e os produtos de consumo da sociedade norte-americana amplamente difundidos mundo afora pela industria cultural desde aquela década. Tarantino faz uso destes elementos causando um anacronismo estético por assim dizer e isso dá todo um charme à atmosfera de suas produções.
Há citações diretas a grandes roadmovies americanos, principalmente a “Corrida Contra o Destino”(Vanishing Point, 1971) e Tarantino serve-nos a eletrizante e vertiginosa sequência do duelo sobre o asfalto entre a máquina à prova de morte e um Dodge Challenger 1970 com motor de 440 hp conduzido pela vingativa Kim (Tracie Thoms) com Zoë Bell no capô do carro fazendo o “mastro do navio”. É o ponto alto do filme, pois daí em diante os nossos nervos já estão à flor da pele e esquecemos que ficamos minutos atrás entediados com diálogos prolixos de linguagem chula e discussões sem propósitos sobre a sexualidade ou outro assunto qualquer, alternados com a cena do primeiro grupo de mulheres assassinadas com a colisão entre os carros detalhada numa coreografia de imagens com direito a esguichos de sangue e multilação. É uma provocação de Tarantino, que nos transporta num piscar de olhos da mais aparente calma à extrema turbulência. Esta sua habilidade em ‘segurar’ o expectador até o final e compensá-lo com uma emoção quase catártica é tarefa para poucos. Diálogos insólitos e multilações à parte, Tarantino é o que podemos chamar de sedutor da juventude cinéfila e dos novos amantes da sétima arte que embarcam em seus delírios e "sacações' ora divertidíssimos ora violentíssimos. Tarantino traz no currículo ótimos trabalhos como "Jack Brown", "Cães de Aluguel" e o recente "Bastardos Inglórios" e deixa a impressão de que seu "À Prova de Morte" foi uma diversão para ele como diretor e uma obra-prima para seus fãs. Nada contra o culto, mas tudo contra os extremismos! Há também de notar-se os comentários à saída do cinema: "Muito firme!", "Muito louco!" ou "É Tarantino na veia!" É o efeito Tarantino!
“À Prova de Morte” (Death Proof, 2007), é um autêntico Tarantino com todos os indispensáveis ingredientes que fazem de seus filmes uma marca reconhecida a cada fotograma e concede-lhe o status de bom diretor e roteirista legitimado por muitos e questionado por tantos outros.
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